1975, Angola, eu (Rui), o pai (Mário), a mãe (Glória) e a minha irmã, Milucha (Maria de Lurdes) vamos regressar à metrópole. O tio Zé, o revolucionário, fica para ajudar os pretos a formar uma nação.
Levo o Decadanse?
A mãe veio para Angola em 1958, para se casar com o meu pai, amigo de infância dela na terra.
Quando se deu o 25 de abril de 1974, os pretos não quiseram obedecer mais. O Sr. Manuel fez bem em sair de Angola em dezembro de 1974.
Voltam sem nada para Portugal, sem o pai: ferido e retido pelos negros que suspeitaram que ele escondia o carniceiro de Grafanil. O tio Zé levou-os ao aeroporto.
Ficam instalados num hotel de 5 estrelas no Estoril, os 3 no mesmo quarto, sem pagar, com direito a pensão completa. O IARN tratou de tudo.
Página 92: o jovem narrador revela que não gostava dos pretos e crítica os empregados do hotel que devem achar que os retornados tiveram de fugir porque exploravam os pretos.
Argumentos dos retornados: sem os brancos lá, eles vão matar-se uns aos outros; uma terra farta, onde se deixa cair um caroço de manga e nasce uma mangueira; quem não quer uma boa mãe, dá-se-lhe uma ruim madrasta…
Eu, Rui, ganho ao Mourita, a aguentar mais tempo no fundo da piscina: fico lá a ameaçar quem tem o meu pai retido que vai ter de se ver comigo se não o devolver.
O Pacaça, o mais radical retornado, odeia o Rosa Coutinho que deu Angola aos pretos e o Almeida Santos que deu Moçambique. Sem esquecer o Bochechas, que nos vendeu.
Os retornados que vivem nos hotéis são desprezados pelos retornados que criaram boas condições em Portugal para um dia voltarem.
Escrevo ao tio Zé para que ele me diga definitivamente o que aconteceu ao meu pai.
Na escola a professora puta que a pariu: sundu ia maié. Os retornados são menosprezados.
O pai morreu!
11 de novembro de 1975: independência de Angola
A mãe tem um ataque epilético na fila para o refeitório do hotel. Eu digo as palavras “expulso-te demónio” e ela acorda e fica bem. Foi sempre assim em Angola. É a doença dos nervos da minha mãe.
Vou de carro com o porteiro Queine buscar uma bicicleta velha a casa dele no monte. Ele mora com Silvana, uma criada do hotel, numa casa por pintar, sem condições.
A mãe vende o medalhão de ouro e a pulseira de prata por 4000 escudos, a um velho penhorista.
Os estrangeiros já não mandam mais dinheiro, os comunistas estão a incitar os trabalhadores do hotel a tomar o hotel e o governo já deu ordem para esvaziar os hotéis.
Os de cá gostam cada vez menos de nós, andámos lá a explorar os pretos e agora queremos roubar-lhes os empregos, além de estarmos a destruir-lhes os hotéis…
Vou de noite com os outros vigiar os contentores com os valores que estão armazenados dos retornados. Estes deixam ali as posses que trouxeram de África, enquanto não arranjam casa e melhor vida.
Falto às aulas com os outros retornados.
Hei de roubar os contentores dos mortos de Sanza Pombo (duas famílias mortas pelos pretos) para arranjar dinheiro para ir com a minha mãe e com a minha irmã para a América.
A minha irmã é boa aluna.
A FNLA e a UNITA têm Luanda sitiada: os americanos e os sul-africanos vão dar luta aos comunas russos e cubanos do MPLA.
Silvana, mulher do porteiro Queine, meteu-se não minha cama, no hotel, e quer que eu vá a casa dela. E eu passo a ir, à noite, quando o Queine está de serviço.
O meu pai regressa. Nunca mais viu o tio Zé. Eu e a minha irmã vamos dormir para a sala de convívio, para eles ficarem sozinhos. Quando o pai souber que chumbei por faltas…
Vamos sair do hotel e viver para uma casa que tem um quarto e uma sala. O pai e uns sócios vão pedir um empréstimo ao IARN para montar uma fábrica de blocos de cimento. Jurou nunca mais sair da metrópole.
Muitos retornados vão para o Brasil e para a Venezuela e para a América, mas o pai não quer ir.
A Silvana está grávida e o Queine muito feliz com isso.
O pai tem o corpo cheio de cicatrizes.
Quando o tio Zé voltou contou que tinham libertado o meu pai porque tinham capturado o carniceiro de Grafanil. O tio Zé voltou porque desistiu de ajudar o povo oprimido durante cinco séculos. A guerra não lho permite… o tio Zé trouxe uma namorada, a Mena?? Teve muita dificuldade para conseguir vir de avião.
Não sabemos como regressou o pai. Ele não conta…
Disse ao pai que tinha chumbado e ele não se zangou e disse que tinha de recuperar no próximo ano.
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