sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A Visita do Brutamontes - Jennifer Egan


Vou olhando para as pernas da Kitty enquanto caminhamos (o mais que posso sem ter de me arrastar pelo chão ao seu lado - pensamento que me passa pelo espírito) e descobrindo que acima do joelho elas estão semeadas de pelos do mais fino ouro. Por a Kitty ser tão nova e tão bem alimentada, tão resguardada da crueldade gratuita dos outros, tão inconsciente por enquanto de que chegará à meia-idade e acabará por morrer ( possivelmente sozinha), por ainda não se ter desapontado a si mesma, apenas se ter deslumbrado a si e ao mundo com as suas façanhas prematuras, a pele de Kitty - aquele saco macio, roliço, docemente fragrante, em que a vida assenta o registo dos nossos fracassos e exaustões - é perfeita. E por "perfeita" quero dizer que nada pende nem descai, nem estala nem se enruga, nem se eriça nem incha - quero dizer que a pele dela é a pele de uma folha, só que não é verde. Não consigo imaginar uma pele daquelas tendo um odor, uma textura ou um gosto desagradável - sendo alguma vez, por exemplo (é francamente inconcebível), o mais ligeiramente eczematosa que fosse.
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Aquele olhar! Aquela mirada! Todas as metáforas brejeiras que se imaginam vêm ao espírito: sol irrompendo entre as nuvens, botões de flores abrindo-se, o súbito e místico aparecimento do arco-íris.
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... e mergulhar os meus braços naquele líquido puro e perfumado que rodopia no interior dela.